A Bagunça das Gavetas



Deixe-me contar uma 'estória', ou três. Sem respeitar qualquer noção clássica de narração (ou não). Posso? Aos 7 anos, tinha mania de usar as caixas de papelão das cestas natalinas para guardar meus brinquedos. Era assim que os levava para a casa dos meus avós em Araraquara. Seu Chico Benedito, meu avô-herói, achava engraçado e ficou surpreso ao saber que aquele era o meu jeito de emular o que via em seu escritório. A caixa de papelão se transformava num escritório portátil, e assim o neto mais biruta passava parte das férias carregando parte de seu mundo numa caixa de papelão.

Anos mais tarde, na caixa havia um skate, a janela para o mundo além-lar. E a gaveta era maior do que a cidade… E a cidade mudava de nome toda vez que o neto biruta entrava num avião. Bendita mania humana de dar vida à seres inanimados… Gaveta vira janela, nave, cidade, poesia… ganha força e vive. Me pergunto se esse impulso não é "coisa do divino".

Das lembranças inexatas de infância, tiro o ânimo para criar minha música. E tudo pode, nem tudo funciona, mas é honesto e verdadeiro. Só sei fazer desse jeito.

Se puder, assista ao video (ou ouça a canção) como se estivesse fuçando uma cômoda velha, um livro antigo, ou assistindo aquele VHS de formatura (que custou uma fortuna).



Post Scriptum: Na verdade, eu curtia ir ao escritório do Vô Chiquinho, mas sempre perguntava se não havia um jeito de levar o escritório para casa — 20 e poucos anos depois, odeio trabalhar em casa.

Bença, Seu Chico Peão!

No comments: